NOTÍCIAS

16/06/2009 03:00
LINA VIEIRA - RESPEITADA DENTRO E FORA DO GOVERNO
A secretária da Receita Federal, Lina Vieira, dispensa apresentações. Como secretária da Tributação do governo Wilma, foi uma ferrenha opositora de algumas gentilezas fiscais que, no fundo, só serviam para aumentar a margem de lucro de empresários. Como coordenadora-geral do Conselho de Política Fazendária (Confaz), que reúne os secretários de Fazenda estaduais, defendeu a argumentação de que o Simples Nacional implicaria em perda de receita para os Estados, principalmente do Nordeste, e em prejuízos à legislação tributária. Muitos empresários torceram o nariz. O governo Lula a promoveu. Nessa entrevista, Lina Vieira mostra porque é sempre uma presença muito respeitada, dentro e fora do Governo. A senhora sempre foi contra algumas desonerações fiscais e a favor de outras. Quando esse estímulo deve ou não ser dado? Sempre que o efeito líquido da desoneração for benéfico para a sociedade como um todo, deve ser concedido. Caso o nível de emprego e a coesão social sejam preservados a desoneração merece ser efetivada. Por outro lado, se o setor agraciado com o favor fiscal não se comprometer a assimilar a desoneração e tiver em mente apenas ampliar a margem de lucro, aí a sociedade como um todo perde e a concessão do benefício não terá valido a pena. A responsabilidade social do empresariado conta muito nessa hora. A fazenda pública deve dispor de mecanismos de monitoramento e controle para identificar se o ponto de equilíbrio foi respeitado ou violado. Há casos em que melhor seria aumentar a renda diretamente do cidadão, direcionada para a aquisição de bens intermediários, por exemplo, da construção civil. Como a senhora vê a situação do Rio Grande do Norte em comparação a outros Estados do ponto de vista da arrecadação? Em fevereiro de 2008, a Doutora Mônica Pinhanez, da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, defendeu uma tese de doutorado no Instituto de Tecnologia de Massachussets, uma das academias mais respeitadas do planeta, cuja indagação era saber o que fazia uma boa administração tributária. Ela comparou cinco Estados. São Paulo, Pernambuco, Bahia, Paraíba e Rio Grande do Norte, considerando SP como estado desenvolvido e rico, BA e PE em desenvolvimento e remediado, e PB e RN em desenvolvimento e pobres. Concluiu que o desempenho potiguar foi superior, em matéria de produtividade fiscal, aos paulistas, baianos, pernambucanos e paraibanos. Acho que temos uma base administrativa sólida e dentro do possível os meus queridos colegas fazendários continuam indo ao limite. Não será agora, quando os potiguares mais precisam deles, diante da maior crise do sistema capitalista desde os anos 30, que vão deixar a peteca cair. Tenho certeza de que, apesar dos pesares, chegaremos melhor do que a maioria dos Estados ao final de 2009. Quais são hoje os gargalos para tornar mais eficiente a arrecadação nos Estados do Nordeste? Ou os problemas são comuns nas demais regiões do país? Ninguém está imune aos efeitos da crise. Há muita coisa em comum. Alguns estados são atingidos mais duramente pela crise em função da sua maior ou menor dependência do fluxo externo. Com o PIB caindo, embora alguns sintam menos, no final todos crescem menos do que poderiam. O segredo reside na cooperação fiscal entre União, Estados e Municípios. Melhorar o grau de coordenação e articulação entre os entes federados tornou-se indispensável. Os ralos da arrecadação encontram muito espaço, exatamente pelo fato do fluxo de informações fiscais não ser compartilhado, embora as operações dos agentes econômicos atravessarem todo o território nacional e desembocarem no exterior. A cooperação deve se dar no âmbito nacional e internacional. Em termos nominais, no primeiro trimestre de 2009, o RN arrecadou cerca de R$ 571 de ICMS. O valor foi aproximadamente 5% superior ao mesmo período do ano passado. Como é possível esse desempenho num ambiente de crise econômica? Temos uma administração tributária em forma. Os programas de governo nacional e estadual estão bem encaixados. Há um mercado interno de baixa complexidade, mas capaz de não permitir o aumento da capacidade produtiva ociosa da economia estadual. A crise afetou duramente o setor industrial. O comércio está sendo bem menos impactado, mantendo a boa performance da arrecadação de ICMS. A Argentina, por exemplo, país que sofreu mais no início desta década, visto como sinônimo de crise viu seu PIB até subir, por conta das relações preferenciais com o Brasil. Mas, sempre é bom continuar trabalhando e orando, como eu faço, pedindo a São Judas Tadeu, o meu santo devoto! A Lei Kandir continua um grande problema para as empresas e para os governos estaduais. Em sua opinião, hoje como secretária geral da Receita, como a senhora vê esse problema? A lei Kandir foi uma gambiarra. Uma promessa vã. Não podemos ter ilusões nesse assunto. Apesar do extraordinário esforço do ministro Guido (Guido Mantega, Ministro da Fazenda), e eu tenho sido testemunha disso, de pagar a conta da crise com desonerações deliberadas, para diminuir a carga tributária de alguns setores e das pessoas físicas, nós só vamos encaminhar a solução desse problema, que não é pequeno, com uma revisão da tributação sobre o consumo, de modo a eliminar o carregamento dos créditos. Melhor baixar a tributação na ponta do consumo e eliminar o creditamento na outra ponta do insumo. Há uma reforma tributária para ser votada no Congresso. A esperança, como diz o dito popular, é a última que morre. O Governo do RN publicou decreto extinguindo o prazo de 180 dias para o exame dos créditos da lei Kandir, no caso de compra desse mesmo crédito por outra empresa. Isso motivou a grita de empresários, já que dispositivo anterior determinava que, após esse prazo, a aceitação do crédito seria automática. O que a senhora pensa disso? Prefiro não opinar sobre isso, embora todos saibam a minha velha opinião, como diria Raul Seixas, formada sobre tudo. Pela Lei Kandir, a aquisição de insumos feitos fora do Estado pode ser tomada como crédito pela empresa exportadora. Isso não gera uma distorção que acaba sobrando para o Estado? A lei Kandir foi um expediente utilizado dentro do binômio “exportar é o que importa” para fazer caixa em dólar, em um momento em que o país estava praticamente quebrado e em rota acelerada de uma crise de fuga de capitais, conforme previra Celso Furtado, e que finalmente aconteceu em 13 de janeiro de 1999. Uma gambiarra sempre termina em curto-circuito, ou cobrando indevidamente a conta de alguém. Quais são os grandes desafios da Receita Federal neste momento? O principal deles, no que diz respeito aos cidadãos, está sendo enfrentado e paulatinamente vencido, que é o atendimento ao contribuinte de forma conclusiva. O tempo médio caiu e há uma perspectiva de racionalização sistêmica de modo a facilitar a vida das pessoas. O segundo é institucionalizar a cooperação e integração fiscal com estados e municípios em busca da efetividade fiscal, dado que os entes federados são autônomos, mas o sistema tributário é nacional. O terceiro é melhorar a aceitação social do tributo mediante a educação fiscal, com base na idéia força de que o tributo é o preço da cidadania. A educação fiscal deveria ganhar as consciências da mesma forma que a educação ambiental o fez. Por fim, estou empenhada em varrer o entulho normativo deixado na esteira do Plano Real. E que tudo isso fosse verdadeiramente sentido e percebido pelo povo brasileiro. Afinal, o tributo é todinho dele, só dele, de mais ninguém! Como a Receita está resolvendo o problema de estrutura da superintendência local? Com muito empenho, tanto do Superintendente em Recife e do Delegado em Natal, meus colegas Altamir e Anchieta, quanto do órgão central em Brasília, para que os potiguares possam ser mais bem recebidos pela Receita Federal do Brasil. Quais são os projetos mais recentes da Receita? Há um planejamento estratégico com vinte projetos estruturantes, que seria exaustivo e maçante discriminar aqui. Mas eu destacaria que a estrutura sistêmica está sendo revista, com base em um novo regimento interno, o foco da fiscalização voltado para os grandes contribuintes vem sendo implementado, o atendimento conclusivo e interativo anda a passos largos e a educação fiscal será reforçada com a logística de destinação de mercadorias apreendidas, especialmente para os municípios com menor índice de desenvolvimento humano, e a aduana brasileira será fortalecida e reforçada. Sem falar no trabalho diuturno de consumar a fusão dos fiscos, ainda inacabado. Isso tem sido encaminhado com ampla participação dos servidores da Casa. Se existe um denominador comum a todos eles? Eu diria que sim. O foco no cidadão e cidadã brasileiros. Quando a senhora assumiu em 31 de julho de 2008 reconheceu que um dos grandes problemas da RFB era o atendimento. O que foi feito nesses 10 meses? A Receita Federal vem implementando, desde o fim do ano passado, algumas mudanças para dar dignidade ao cidadão e melhorar o atendimento. Introduzimos novos serviços na página da RFB com acesso aos contribuintes (pessoa física) através de senha para regularização das Declarações do Imposto de Renda que apresentarem pendências. O serviço poderá ser acessado através do endereço eletrônico da Receita (www.receita.fazenda.gov.br) e acessado mediante a utilização de código de acesso ou certificado digital. Para a Receita Federal, mais de 50% das declarações com alguma pendência poderão ser regularizadas pelo próprio contribuinte, sem que seja necessário comparecer a uma unidade de atendimento. Esse é mais um serviço que confere maior transparência e agilidade ao atendimento da Receita Federal do Brasil. Com vai funcionar na prática? Após gerar um código de acesso, o contribuinte poderá entrar no Portal e-CAC e verificar eventuais pendências na Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física e saber o que é preciso fazer para resolvê-las. Depois, poder` acompanhar o pagamento do imposto e alterar opções referentes ao débito automático das quotas. Poderá também identificar eventuais problemas no depósito da sua restituição. E, finalmente, se for o caso, parcelar possíveis débitos em atraso relacionados a sua declaração ou a outras pendências com a própria Receita Federal e com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. A geração do código de acesso é um processo simples, rápido e realizado via internet. O contribuinte precisará apenas informar o CPF, a data de nascimento e os números dos recibos de entrega das declarações de ajuste anual do imposto de renda (DIRPF) referentes aos exercícios de 2008 e de 2009. A RFB também está enviando, via SMS, informação sobre a restituição dos contribuintes. Basta que o contribuinte cadastre seu celular na página da RFB. O número de celulares cadastrados já chega aos 42.000 e já foram enviados aproximadamente 10 mil torpedos aos contribuintes. A Receita recebeu este ano 25,2 milhões de declarações de pessoa física. Fonte: Tribuna do Norte