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13 de janeiro de 2023

Risco fiscal à vista: medidas aprovadas nos últimos anos pressionam o caixa ...

 

Medidas aprovadas nos últimos anos pelo Congresso Nacional, sendo com o apoio do governo Bolsonaro ou mais recentemente, em paralelo à “PEC da Transição” endossada pela equipe de Lula, criam um risco fiscal para o Brasil nos próximos anos. Para além de um aumento de gastos contratado, a falta de transparência nas medidas — para muitas, não há estimativa clara de impacto fiscal — deixará a equipe econômica navegando no escuro em sua tarefa de resgatar a credibilidade das contas públicas brasileiras.

Há diversos novos gatilhos de gastos, alguns com desdobramentos, como os aumentos salariais no Executivo federal, que podem ser replicados em estados e municípios. Se todos fossem acionados ao mesmo tempo, o total de despesas extras, neste cenário mais extremo, seria de R$ 366 bilhões, estima o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper.

A cifra inclui a controversa liminar de Gilmar Mendes, do STF, que permite que os gastos do Bolsa Família possam ser feitos por crédito extraordinário e, portanto, fora do limite do teto de gastos, com impacto potencial de R$ 156 bilhões — embora não esteja mais no radar, com a aprovação da “PEC da Transição”.

Dívida e inflação

Para Lisboa, que foi secretário de Política Econômica no primeiro mandato do presidente Lula, existe o risco de piora do desequilíbrio fiscal e de aumento da dívida pública, podendo levar à recessão e ao desemprego:

— É mais do que um risco para a estabilidade fiscal. Com o gasto comprometido, a dívida cresce e a inflação pode voltar, o que pode gerar aumento dos juros.

O coordenador do Observatório Fiscal do Ibre da Fundação Getulio Vargas (FGV), Manoel Pires, alerta para outra bomba fiscal que são os precatórios (dívidas judiciais da União). Pelos últimos números, a conta chega a R$ 90 bilhões, sem qualquer plano para atacar esse gasto.

O pagamento foi empurrado para frente no fim de 2021, para aumentar o espaço fiscal destinado ao Auxílio Brasil:

— No caso dos precatórios, não pode deixar isso solto. É preciso fazer um diagnóstico, ver onde está crescendo, se a União precisa de reforço na questão judicial.

Pires cita outros dois pontos de atenção: a compensação da União para estados e municípios para custear o piso da enfermagem e a queda de receita com ICMS. E na parte da receita, a oscilação do preço do petróleo, que foi muito favorável no último ano, mas é volátil.

— Deixou de ser um risco fiscal, já virou uma certeza. Isso acontece em períodos eleitorais, e o governo se ausentou depois das eleições. Nesses momentos, o Congresso perde a linha, aprovando e aumentando o gasto — comenta Pires.

Na visão de Lisboa, do Insper, o caminho a ser trilhado pela equipe econômica, para evitar sérios problemas, é financiar os programas sociais cortando despesas e revendo desonerações de tributos e outras benesses adotadas, principalmente, nos últimos dois anos.

O economista aponta, ainda, a dificuldade para se calcular o impacto das medidas aprovadas recentemente, como o piso da enfermagem e a compensação pela desoneração dos combustíveis. A lista de aumento de gastos elencada por Lisboa inclui os R$ 168 bilhões para cobrir o Bolsa Família.

Também entram na conta R$ 24 bilhões que poderiam ser gastos acima do teto de gastos, devido a uma previsão superestimada do IPCA (7,2%), quando o mercado prevê em torno de 5,8%. Entram, ainda, no mínimo R$ 16 bilhões que a União terá que gastar para cobrir os custos do aumento do piso salarial dos profissionais de enfermagem.

Ainda falta no cálculo o impacto dos dez projetos de reajustes salariais para os servidores, da medida provisória com desoneração de impostos para o setor aéreo e da derrubada de cerca de uma dezena de vetos presidenciais no fim de 2022.

— Quando vemos que, junto com a “PEC da Transição”, outras categorias estão se beneficiando com o aumento de despesas, há, sim, uma preocupação muito grande com a estabilidade fiscal. Não há recursos para financiar esse monte de gastos. Isso traz a percepção de que a estabilidade pode estar comprometida — diz a economista Juliana Inhasz, também do Insper.

‘Fácil aumentar gastos’

 

Além das medidas elencadas por Lisboa, no apagar das luzes de 2022 o governo Bolsonaro aprovou isenções que, segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, têm potencial impacto de até R$ 15 bilhões. Um exemplo é o decreto assinado pelo presidente exercício Hamilton Mourão, em 30 de dezembro, que reduziu as alíquotas do PIS e da Cofins sobre receitas financeiras.

O decreto foi revogado no início deste ano, mas sob risco de questionamento judicial de que não foi cumprida a noventena, se a Justiça avaliar que houve aumento de tributos.

Para Silvia Matos, também da FGV, essa aprovação maciça de medidas mostra é que fácil “aumentar gastos no Brasil”. Ela cita ainda a pressão para aumentar o salário do servidor, que está há quatro anos sem reajuste, e da alta real do salário mínimo:

— Isso num momento em que começamos o ano com déficit e com economia mais fraca, sentindo os efeitos de uma taxa de juro real alta.

Pires destaca que o atual governo conseguiu vitórias importantes no Congresso, como a “PEC da Transição” e a reversão em parte do orçamento secreto. Isso pode, segundo ele, ajudar a aprovar medidas na Casa para fazer os ajustes necessários:

—Vejo com bons olhos o lado político.

Fonte: O GLOBO

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