Notícias


17 de novembro de 2020

As medidas para tributação menos onerosa nas classes de menor poder aquisitivo

 

Por Filipe Araújo da Paz

Em um cenário ideal no sistema tributário brasileiro, a Justiça fiscal estaria nas despesas atendendo as necessidades básicas dos cidadãos, e na receita com uma arrecadação justa.

Por arrecadação justa entende-se como aquela de menor participação de tributos indiretos e maior abrangência dos tributos diretos. A conjuntura da tributação brasileira prevê justamente o inverso. O sistema deveras regressivo contribui para o aumento da desigualdade social.

A virada de chave de um sistema regressivo para a progressividade, de acordo com Raquel Di Creddo, "promove o fortalecimento da economia com produtos mais competitivos no mercado e aumento da capacidade de consumo, gerando riqueza e crescimento social e econômico [1]".

A revogação da isenção do Imposto de Renda sobre a distribuição dos lucros e dividendos é uma das medidas que contribuem para essa virada de chave. Entretanto, trata-se de um passo, a revogação em si não é capaz de alterar o sistema, apesar de beneficiá-lo. É necessário que se reduza a incidência da tributação sobre o consumo e dos demais tributos indiretos, além de alterações na sistemática do Imposto de Renda e toda adoção de medidas que impliquem em maior equidade tributária.

Em conjunto com a revogação do artigo 10 da Lei 9.249/05, estaria a revogação do artigo que o antecede eliminando a figura fictícia dos juros sobre o capital próprio. A ampliação das faixas da tabela progressiva do Imposto de Renda, com a inclusão de alíquotas maiores que alcancem rendimentos mensais acima do máximo permitido, atualmente de pouco menos de R$ 5 mil reais, se apresenta como mais uma medida que implica em progressividade.

Além destas, a representatividade da carga tributária incidente sobre o patrimônio, como demonstrado anteriormente, é verdadeiramente baixa. Para Piscitelli, há espaço para tributação a ser explorado quando se trata do patrimônio, sobretudo em relação às heranças. A alíquota média nacional do ITCMD é de ínfimos 4% [2]. Some-se isso ao fato de que o patrimônio reunido dos bilionários brasileiros alcança cerca de R$ 424,5 bilhões, porém, metade desse valor advém das heranças do patrimônio familiar [3].

Entre os bilionários citados e entre as famílias mais ricas, concentram-se, de igual modo, bens de luxo, como iates e aeronaves, que não recebem a tributação do IPVA. O STF, no Recurso Extraordinário 379.572/RJ [4], rechaçou a tributação do IPVA sobre embarcações e aeronaves, sob a justificativa de que o imposto sucedeu a taxa rodoviária única, que excluía tais bens.

Ampliar a base de cálculo do IPVA para abranger as aeronaves e embarcações implicaria em aumento de arrecadação estimado entre R$ 1 bilhão e R$ 2 bilhões, somado ao melhoramento de alíquotas progressivas por valor venal do bem automotor [5].

Em caso de impossibilidade de se estabelecer a progressividade das alíquotas do IPVA, a proposta de reforma tributária solidária prevê o aumento da alíquota do imposto, porém com a oferta de um desconto monetário de cerca de meio salário mínimo ou um salário mínimo, o que implica em isenção ou em um valor residual a pagar, beneficiando, portanto, proprietários de automóveis mais pobres que detém, em regra, veículos populares [6].

Para além da tributação sobre o patrimônio, várias foram as propostas, muitas delas ainda ativas, de desoneração da tributação sobre a folha de pagamento, com a compensação da perda da Previdência Social a partir de outras receitas tributárias. Nessa esteira, Fagnani et al (2018), assim dispõem:

"A linha de redução parcial da carga de tributos sobre a folha, de forma progressiva e plenamente compensada por contribuição sobre o valor adicionado, é uma possibilidade interessante. Com isso seriam mitigados os impactos setoriais, seria assegurado o nível de financiamento das políticas públicas e o tributo não distorceria a alocação de recursos na economia. Afinal, a folha de salários é parte do valor adicionado na economia, e sua substituição pelo faturamento ou mesmo pela movimentação financeira, acabaria em cumulatividade e distorções indesejáveis" [7].

A desoneração da folha, com o olhar atento à garantia da manutenção dos recursos para o financiamento da proteção social, mostra-se como medida impactante para o alcance de maior justiça fiscal.

Tais medidas, em conjunto com a redução da carga tributária incidente sobre o consumo, que representa praticamente metade da totalidade da carga tributária brasileira, implicaria em uma maior igualdade das bases de tributação, aliviando o fardo sobre as classes de menor poder aquisitivo e por consequência, aproximando-se da Justiça fiscal.

 
 

Fonte: Consultor Jurídico

Logo Maxmeio