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02 de abril de 2012

GUERRA FISCAL E A COMPETÊNCIA DO SENADO

Mais uma vez, a guerra fiscal e suas consequências sobre o desenvolvimento ocupam o noticiário com manifestações sobre os aspectos políticos, jurídicos e econômicos da possível aprovação, pelo Senado, do Projeto de Resolução nº 72, de 2010. Essa norma tem por finalidade fixar em 4% a alíquota do ICMS nas operações interestaduais incidente sobre mercadorias importadas. Aprovando a medida, o Senado poria fim a um conflito ainda contido, mas que ameaça tomar proporções bem maiores e ameaçar seriamente o pacto federativo.

Pelo papel que lhe cabe na manutenção da Federação, o Senado tem a difícil missão de regular os aspectos essenciais do imposto que constitui a maior fonte de receita dos estados, estabelecendo "as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação". As importações estão compreendidas entre as operações tributadas segundo a alíquota fixada por resolução do Senado sempre que uma mercadoria desembarcar em um estado com destino a outro.

Não há como justificar a inconstitucionalidade de norma editada com base na competência plena outorgada pela Constituição ao Senado para dispor sobre a alíquota do ICMS incidente nas operações interestaduais, pouco importando que ela se origine no exterior ou dentro do país. Essa competência também se justifica pela necessidade de estabelecer limites à natural propensão dos estados de buscar o aumento de receitas com a tributação de operações que se encerram ou se originam em outros estados.

O Confaz ainda não cumpriu plenamente a sua missão. O que falta ao órgão sobra ao Senado: a legitimidade popular outorgada aos seus membros, o papel constitucional outorgado pela Constituição de solucionar em definitivo os conflitos federativos. Mas é dentro de um ambiente acalorado de discussão que se ouvem argumentos sustentando a inconstitucionalidade dessa medida, mas que estão dissociados da essencial compreensão do papel que a Constituição reservou ao Senado ? a de instituição encarregada de resolver disputas que coloquem em conflito os estados que compõem a República.

Diz-se que a matéria deveria ser tratada por lei complementar e não por resolução. Mas é a Constituição que expressamente atribui a uma resolução do Senado, de iniciativa do presidente da República ou de um terço dos senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros, a função de estabelecer as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação (artigo 155, § 2º, IV).

Há quem sustente que haveria desvio de finalidade do projeto de resolução porque a sua proposição teve como justificativa a eliminação da guerra fiscal. Mas, ainda que os fundamentos do projeto de resolução estivessem dissociados da real finalidade, não se registra nos compêndios do direito constitucional nenhum caso de inconstitucionalidade de uma norma por disparidade entre o seu texto e os motivos que fundamentaram a sua proposição. Editada, a norma adquire vida própria. E será interpretada de maneira objetiva, dentro de um sistema normativo hierarquizado, em cujo topo reina a Constituição.

Sustenta-se também que a fixação de uma alíquota interestadual uniforme para o ICMS discriminaria os produtos nacionais, favorecendo os estrangeiros. A primeira falha desse raciocínio é desconsiderar que muitos dos bens importados são matérias-primas, máquinas e equipamentos destinados à produção de bens. Esquece-se também que a finalidade da unificação é preservar a sanidade do sistema tributário, evitando disputas que levariam ao desequilíbrio regional.

A função essencial e mais importante do Senado é a de garantir o equilíbrio da Federação, resolvendo os conflitos que são naturais em uma federação, com a autoridade que detêm os seus integrantes pela condição de representantes qualificados de seus estados. É nesse espaço democrático e institucional que são construídos acordos capazes de reduzir as diferenças que aguçam as disputas e ameaçam a nossa forma de Estado.

É preciso reconhecer que não há nenhum obstáculo legal à fixação da alíquota do ICMS nas operações interestaduais de importação de mercadorias por resolução do Senado. As dificuldades, que não são poucas, serão resolvidas com habilidade política e com a adequada compreensão dos efeitos econômicos e sociais da atual e desequilibrada forma de cobrança desse tributo.

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