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04 de julho de 2011

CRÉDITO ENCARECE E ENDIVIDAMENTO DISPARA EM NATAL

A última grande aquisição do policial Marco Aurélio (o nome é fictício) comprometeu quase 50% de sua renda familiar durante cinco anos - muito acima do limite recomendado pelos economistas e num prazo muito extenso. Marco comprou um carro e apesar de ter parcelado em 60 vezes, enfrenta dificuldades para quitar as parcelas. Como ele, sete em cada dez famílias natalenses estão endividadas. Contrariando as expectativas dos economistas, que esperavam queda no endividamento no Nordeste já neste primeiro semestre, devido à política de restrição de crédito adotada pelo governo federal no início de 2011 e a migração de crédito para o Sul e Sudeste, o número de famílias endividadas em Natal subiu 10% entre janeiro e maio de 2011, em comparação ao mesmo período de 2010, enquanto nas outras capitais subiu, em média, 5%. Os dados incluídos na Radiografia do Endividamento das Famílias nas Capitais Brasileiras, da Fecomércio/São Paulo, revelam que não foi só o número de famílias endividadas que subiu na capital potiguar. O valor total da dívida também avançou em relação ao mesmo período do ano passado. Na capital potiguar, o montante subiu 54%, 20 pontos percentuais acima da média nacional. Natal ficou atrás apenas de Curitiba, que registrou um avanço de 59%. Já a dívida média por família subiu 39% - o maior avanço registrado no país inteiro. Para Altamiro Carvalho, economista da Fecomércio/São Paulo, entidade que realizou o estudo, a causa do crescimento natalense acima do nacional ainda é um mistério. Mas a oferta desenfreada de crédito - artifício usado para manter a economia aquecida durante a crise econômica mundial - e a posterior restrição de crédito - estratégia usada para desaquecer a economia brasileira e afastar o fantasma da inflação - explicam, ao menos em parte, o comportamento de boa parte das capitais brasileiras. Em algumas delas, como em Natal, por exemplo, as duas medidas adotadas pelo governo federal em momentos e gestões diferentes não atingiram o efeito esperado. O natalense começou a gastar mais com a abertura do crédito e não parou de gastar quando o crédito ficou mais escasso e mais caro. Para o economista Janduir Nóbrega, vice-presidente do Conselho Regional de Economia do RN, a facilidade de crédito do setor público e o aumento da renda nas classes C e D são alguns dos fatores por trás do endividamento dos natalenses. Nos primeiros cinco meses do ano, o número de famílias endividadas pulou de 154.095 para 169.146 na capital potiguar (15.051 se endividaram no primeiro semestre de 2011), e a dívida mensal dessas famílias saltou de R$1.100 para R$1.531, colocando Natal na frente de todas as capitais brasileiras. Enquanto os brasileiros em geral comprometem, em média 18% de sua renda com dívidas, os natalenses comprometem 39%, proporção muito acima da ideal, que é 29% (1/3 da renda). Quanto maior o comprometimento da renda, alerta Altamiro Carvalho, maior o risco de inadimplência. Para Janduir, a regra é uma só: planejamento. Os números da Fecomércio/São Paulo não mostram, porém, as faces do endividamento em Natal. Frias, as estatísticas não reproduzem o esforço de natalenses como Marco Aurélio, policial que faz bicos nas folgas para conseguir quitar as dívidas e não perder seu carro, ou o esforço da pensionista Maria de Lourdes Moura, que se equilibra numa verdadeira corda bamba para controlar o orçamento e não atrasar o pagamento de nenhuma despesa. Consumidores lutam para evitar inadimplência Natalenses, como Marco Aurélio e Maria de Lourdes, citados no início da reportagem, apesar da quantidade de dívidas ou despesas a pagar, lutam para não entrar na lista dos inadimplentes. Marco, por exemplo, comprou um carro e apesar de ter parcelado em 60 vezes, enfrenta dificuldades para quitar as parcelas. Até o momento, já pagou 13 e se equilibra na corda bamba para quitar as outras 47. "Tive que deixar de fazer algumas coisas para poder pagar o carro", revela. O plano de saúde da família foi um dos primeiros a serem cortados. "Também tive que trabalhar mais". Para complementar a renda, Marco Aurélio faz segurança privada em estabelecimentos comerciais, embora a profissão não permita. "Antes eu não precisava fazer bico, agora preciso. Tenho que fazer, se não, não dá para pagar", admite. Marco é casado e tem um filho, com menos de 18 anos. Além das dívidas, também precisa pagar todas as despesas da casa. Às vezes, falta dinheiro, e o pagamento das contas é adiado para o mês seguinte. "Tenho que fazer este esforço todo mês". Para ele, quitar as dívidas é uma questão de dignidade. Não importa o quanto trabalhe para mantê-la. Na casa da pensionista Maria de Lourdes Moura, 51, não são as dívidas que preocupam, mas as despesas: plano de saúde, água, energia elétrica, escola, telefone, que representam 60% de sua renda mensal. Ela não precisou adquirir nada para comprometer mais da metade de sua renda. Para não se endividar, Maria de Lourdes anota todas as despesas numa caderneta. O hábito vem de longa data. "Primeiro, anoto o que estou devendo. Depois, o que paguei. E por fim, as dívidas que ainda falta quitar. Se não anotasse, não saberia o que devo". A família também colabora no final do mês. O marido faz as compras e paga algumas dívidas e um dos filhos, que trabalha, mas ainda mora com ela, paga algumas despesas. No final, ainda lhe resta R$200. "Não me endivido, porque tenho controle sobre tudo o que eu vou fazer. Tudo é estudado e colocado no papel, independentemente do valor". Fonte: Tribuna do Norte

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